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HISTORIAS DE SERENATA: “O calor que aqueceu e iluminou a escuridão”

O grupo Serenata & Cia. proporciona com sua arte, em um estilo musical que atravessa gerações e modernismos, belas homenagens e momentos marcantes, como este:

“Era um sábado estranho, desses em que o céu parece pesar mais do que o normal. A cidade ainda se recuperava do temporal da véspera — postes caídos, ruas alagadas, semáforos apagados.

Em meio a esse cenário confuso, Fredi Jon recebeu um pedido incomum: Dona Lúcia o convidava para fazer uma serenata para a irmã de sua sogra, dona Gertrudes, que completava 80 anos naquela noite.

Mesmo sabendo das dificuldades, Fredi aceitou. Guardou o violão e seguiu rumo ao prédio no centro da cidade, onde a comemoração deveria acontecer. Mas, ao chegar, deparou-se com mais um obstáculo: o edifício estava sem energia. Elevadores parados, corredores escuros, moradores sem saber o que fazer.

Dona Lúcia o recebeu com um sorriso cansado e um prato de churrasco improvisado na garagem iluminada por lanternas. As convidadas mais jovens tentavam manter a animação, mas havia uma ausência clara: Dona Gertrudes e as demais senhoras não conseguiam descer os seis andares até o térreo. Estavam todas presas nos andares superiores, como se a festa tivesse ficado espalhada, em silêncio, pelo prédio. Foi então que Fredi disse:

“Pessoal, acho que ficará inesquecível irmos todos ao encontro dela, eu começo a cantar e depois vocês aparecem. O que me dizem?” E, como se aquela fosse a senha que todos aguardavam, alguns convidados se levantaram imediatamente. Outros hesitaram, mas acabaram seguindo. Um grupo pequeno, com passos lentos, olhos atentos ao escuro, subindo juntos como se fossem parte de algo maior do que uma simples homenagem.

Ao chegarem ao sexto andar, Fredi parou diante da porta de dona Gertrudes e começou a dedilhar os primeiros acordes da música preferida dela. Uma canção antiga, quase esquecida, mas que carregava a memória da infância. Lá dentro, ela estava sentada, e algumas velas tentavam iluminar aquela decepção, mas ela insistia em não desistir da noite.

Quando ouviu a melodia, levantou-se lentamente, como se algo a puxasse de volta à juventude. E então, os rostos começaram a aparecer no corredor. Luzes fracas de celulares iluminavam sorrisos, olhos marejados, mãos que se seguravam nas paredes. Ela levou as mãos ao peito.

“Vocês vieram…” — murmurou, sem acreditar.

Fredi tocou sem dizer palavra. O grupo se espalhou pela sala, pelo corredor, pelas escadas. Cantaram juntos. Choraram em silêncio. Riram com os olhos. A festa, enfim, havia subido. No fim da serenata, dona Gertrudes se aproximou de Fredi. Encostou o rosto no ombro dele e sussurrou, como quem entende uma coisa só quando ela acontece:

“Eu esperei a noite inteira por isso. Mas, pensando bem, talvez eu tenha esperado oitenta anos”.

E então ficou claro: Não era sobre a música, nem sobre a luz. Era sobre quem sobe as escadas com você quando tudo parece escuro”.

Texto: Fredi Jon

(Outras histórias são encontradas no MINUTO Serenata disponível no site: serenataecia.com.br e no YouTube)

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